sexta-feira, 9 de outubro de 2009

O CORO DA VILA ESQUECIDA

 

Meu nome é Yohanan, sou um viajante e colecionador de artigos raros, ganho a vida com o comércio de tecidos de  rhina e com as pratarias de potosí.

Uma vez eu estava andando pelas montanhas de um país do sul, segui os caminhos de um mapa que comprei na região. Mapa muito bonito, feito com esmero, em couro de bode.

Andei por ravinas, cruzei riachos, comi frutos locais e cruzei pontes frágeis como gravetos.

Ouvi sons de pássaros, mas não os vi, senti cheiro de flores de orquídeas, mas não pude encontra-las.

Andei até meus pés decidirem seus próprios rumos, apenas me deixei levar; fui seqüestrado pelos meus músculos, minha alma ficou refém de meu corpo por 21 dias.

Foi quando acordei em uma cama que nunca estivera, nunca tive uma cama minha, o mundo sempre me foi teto, e o chão o leito meu desde o berço.

Perto da cama o som de madeira sendo queimada, um cheiro de ervas sendo cozidas e uma luz muito trêmula, que cortava a fumaça, desenhando formas que não conseguia distinguir.

Ao longe eu ouvia vozes, todas muito bem afinadas entoavam um canto: triste, belo e nostálgico.

Algo como: “ Oh quão santa, tão amiga, (…) somos os teus medos na terra(…) nossos nomes viraram cantigas, nosso sopro apagou-se com velas( …) somos teus para sempre(…) nosso sono, velado em leito de flores (…) nossos amores comeram terra,…”

Era um canto longo, parecia durar dias; algumas vezes, uma ou outra voz se destacava e cantava feitos heróicos, como também, entoava cenas miseráveis.

Durante 3 dias arregimentei forças, mas meus músculos estavam exaustos, de modo que fiquei entre o sono do corpo e a euforia da alma.

finalmente fiquei de pé !

Sai da casinha em que estive, não vi ninguém, mas vi muitas coisas,…

Depressa sai daquele lugar, fechando os olhos e correndo feito louco; machuquei os pés e recebi pancadas em todo corpo, sentindo frio intenso nas costas e um sopro quente na testa.

Desmaiei e acordei no local onde havia comprado o mapa.

Muita gente a minha volta.

Estava babando e com um cheiro horrível, barbudo feito um bode velho, com a garganta seca e o corpo doído.

Me contaram que fui achado nas montanhas, e que na minha boca havia um suco marrom e restos de cogumelo.

Disseram que eu cantei uma música que ninguém entendia, e, por pouco não fui enterrado vivo, pelo medo que o povo tinha de bruxaria.

Nunca mais voltei às terras do sul.

quinta-feira, 8 de outubro de 2009

O COLAR DE LISANDRA

Havia numa cidade muito pequena, localizada em uma ilha muito distante do continente, uma vila de pescadores.

Nesta vila viviam, Ditomasio e sua jovem e bela esposa Lisandra.

Ditomasio era apaixonado por Lisandra, amava-a mais que tudo, e, amava muito a vida, o mar, os ventos frios e as manhãs de neblina, todos muito costumeiros naquele lugar.

Lisandra apenas gostava de Ditomasio, e ainda assim, gostava do respeito e admiração que ele tinha de todo na ilha.

O povo da vila não gostava de LIsandra, achavam-na muito antipática e vazia, fosse como fosse, a tal antipatia vinha das falas de Lisandra que, sempre tinha assunto, desde que o papo fosse: jóias, roupas, riqueza e fama.

Um dia Lisandra achou um prato de bronze, enquanto caminhava na beira da praia, havia en tal prato o desenho de um tridente, cercado por flores e por caveiras.

E do lado inverso do prato havia uma prece, um pacto, que assim dizia: “ Bela para sempre, de todo adornada, desde que a vida dada, de amor seja feita, a dona do prato satisfeita, e, o colar lhe ornando o corpo, Poseidn jura que o desgosto, não terá tamanho e nem fim”

Lisandra leu e não entendeu.

Levou o prato a Sarxis, uma velha agoureira, e a anciã lhe explicou: – O prato só aparece aos de coração vazio ! E se o prato receber o sacrifício de um coração cheio de amor, dá ao seu senhor, tudo quanto quiser, desde que o senhor do prato use o colar que sela o pacto.”

Lisandra não pensou mais; chamou Ditomasio para um passeio em seu barco à vela, pediu que levasse frutas e vinho, pão e velas.

Foram os dois em meio ao mar tranquilo da ilha. o vento soprava gostoso, com cheiro de colméia.

Os dois comeram, beberam e fizeram amor intensamente à luz das velas, estrelas e lua.

Ditomaso dormiu; acordou todo amarrado,  com a âncora do barco no peito, foi empurrado por sua amada, recolhido ao leito de morte oceânico.

Lisandra regressou sozinha, chegou na praia e viu uma linha dourada, andou recolhendo-a, achou um colar lindo, cheio de jóias, e, o fio era de ouro.

Vendeu o ouro e ficou rica, colocou o colar e ficou famosa.

Vivei mais 35 anos, sempre jovem, sempre bela, sempre rica,…

Morreu afogada com um copo de água, sozinha, feia como a desgraça, velha como o tempo e fedia mais que qualquer carcaça, enterraram-a fundo, e com um âncora no peito.

Usaram seu túmulo como recipiente, para toda matéria indigente, fezes, urina e qualquer imundície.

Lisandra chegou no mundo dos mortos, sem olhos, sem língua e sem coração

quarta-feira, 7 de outubro de 2009

O PARDAL


HAVIA NUMA VILA DE PLANTADORES DE CENOURA UM MENINO DE UM OLHO SÓ. SEU NOME ERA SORANO E ELE VIVIA A OLHAR OS CÉUS. NASCEU NORMAL, PERFEITO, CONTUDO, AOS 5 ANOS SAIU PASSEANDO SOZINHO PELA VILA; GRITOU, ACORDOU NUMA CAMA, AOS CUIDADOS DE UMA VELHA DESCONHECIDA. TODAS AS MANHÃS ACORDAVA CONTADO SONHOS. SONHOS COM NUVENS, SONHOS COM MATAS, SONHOS COM VILAS AOS QUAIS ELE NUNCA FORA, SONHOS COM PESSOAS AS QUAIS NUNCA CONHECERA. SORANO TINHA UM MEDO ENORME DE GATOS, COBRAS, AVES DE RAPINA E PREDADORES DE PEQUENOS ANIMAIS. CERTA MANHÃ SORANO ACORDOU CHORANDO, LÁGRIMAS DE UM OLHO SÓ. SONHOU COM UMA CAMPINA, CHEIA DE HORTALIÇAS E EM ESPECIAL UM CAMPO DE CENOURAS, NADA DE NOVO, EXCETO PELO SOM DE UM TROVÃO E UM CUSPE COMO DE FOGO. DESDE ENTÃO, SORANO, SÓ SONHA COM COISAS DA TERRA. ELE NÃO SE LEMBRA, MAS, EU ESTAVA LÁ. VÍ QUANDO ELE CAIU EM CIMA DE UMA ARAPUCA, FUROU UM OLHO; O ACIDENTE LIBERTOU UMA AVE, UM PARDAL, QUE FUGIU VOANDO. O OLHO QUE SORANO PERDEU, LIBERTOU O PARDAL, QUE SE SENTIU GRATO.
O PAI DE SORANO, ODIAVA OS PARDAIS, QUE ARRUINAVAM OS QUINTAIS E METIAM O BICO EM TUDO QUANTO FOSSE HORTA.
MATOU O PARDAL, QUE LHE DEVORAVA AS CENOURAS RECÉM COLHIDAS, CEGOU SORANO DO OLHO CELESTIAL.
SORANO ATÉ HOJE OLHA PARA OS CÉUS, COMO QUEM SENTE SAUDADE DE CASA.

terça-feira, 6 de outubro de 2009

ARCO-ÍRIS LUNAR



OS ENCANTOS DAS CORES ESCURAS

Quando chove, em noites de lua cheia, a luz do sol refletida na lua cria um efeito todo especial: o arco íris lunar.

O espectro criado por esse fenômeno é invisível aos olhos humanos, porém, os animais com a capacidade de visão diferente da nossa, conseguem ver o arco íris lunar.

Algo como um círculo branco se posiciona em volta da lua, formando uma espécie de olho de DEUS, com a lua como a íris desse globo ocular. E a beleza das trevas se comprova de maneira ainda mais evidente, um espetáculo da noite, uma primavera invisível e silenciosa, contudo, deveras linda de ver.

Um arco íris maravilhoso, cheio de cores que não posso descrever, cheio de flores que não posso ver, cheio de vida que não posso matar. Um elo perdido.

As trevas deixam a habitual maldade e se entregam ao canto inaudível da serenata cósmica, sob o belo arco íris negro, branco , cinza e cor de cegueira.

Uma festa de morcegos e insetos, um feriado santo para os bichos das cavernas.

Quando surge o dia, como um moleque atrevido, futricando com luz tudo quanto toca, como que espiando pela fechadura do universo e enchendo de luz toda a formosura linear do horizonte; os adeptos do culto oculto, os sacerdotes do invisível, conjuntamente com os cardeais da cegueira, olham para a matinal estrela, e, com desprezo, dizem:

Vamos ! Que a luz já contamina e amanhã é segunda-feira.