segunda-feira, 29 de março de 2010

NINGUÉM ME DISSE QUE SERIA ASSIM.

EU achei que era daquele jeito, achei que desde que tivesse feito, estaria feito, que não tinha erro e tudo estava programado.

Eu tava errada, nem de longe eu imaginava o quanto tava enrascado, que a vida me faria um escarrado.

Eu perdi a força, perdi a vontade e o vigor, contudo, ainda me resta fresco o horror, junto o medo das promessas não cumpridas, e quão compridas foram as noites.

Eu não dormi, refleti tanto que quase produzi luz própria, luz que não brilhou em mim, nem mesmo piscou, oque ficou foi um som chato e agudo.

Eu penso que as vezes é bom e as vezes não é, não me decidi ainda se queria ou não ter vindo, se fui bem vindo ou se foi só obrigação.

Eu não recebi de mim ainda o perdão, nem mesmo a consideração por ter sido eu esse tempo todo e nada ter pedido em troca de mim mesmo.

Vai ver é só festejo e eu estou de fora, vai ver eu estou fora de mim mesmo ou estou dentro de um outro alguém. queria saber quem.

quarta-feira, 24 de fevereiro de 2010

A PALHOÇA

Tudo ali era tão simples.

Água na moringa.

Tudo era tão seguro.

Farinha na tigela.

Tudo era tão igual.

Vacas no jiral.

Tudo era tão distante.

Notícias de um parente errante.

A palhoça não mudava, era sempre de palha, arame, pregos e paus. Podia o mundo cair, podia a morte surgir, podia que podia tudo !

Nada movia um palmo daquela palhoça, era como se o tempo ficasse ali pitando seu cachimbo.

Uma nuvem ou outra se atrevia a tomar formas interessantes.

Em dias assim, cheios de sons e movimentos, que eu sinto falta e choro um choro besta e arrependido, de quem deixou a palhoça.

sábado, 20 de fevereiro de 2010

POÇOS ESPELHADOS

 

Eu estava lá.

Cheio de planos e esperanças, olhando para cima, dando significados às formas que as nuvens assumiam…

Cheio de uma risada sonsa, pisando uma pisada de trouxa.

Amando cada fecho de luz,  seguindo um caminho que a nada conduz, e tropeçando aos borbotões.

Eu e minha cabeça, com planos e ações, soluções, nações e aptidões.

Eu conheci cada segredo, e com argúcia discerni entre as coisas ostensivas e as secretas, eu abria janelas abertas e fechava as que não conseguia abrir.

Eu avistava caracarás, aprendia sobre os marajás, repudiava o terrorismo e queria o bem, a integridade e gostava disso tudo, especialmente se feito com maestria e discrição.

Eu corri no sol, eu nadei no verde das águas cheias de lodo, eu enchi minhas meias de areia, eu comi pouco, eu quase morri.

Vivi como quem vive de sopro, e no caminho todo, cheio e amplo, como nem o inferno pode ser, eu estava sob as suaves algemas da clausura.

Tudo tão profundo, tudo tão sem fundo, tudo tão diferente de mim.

E nisso tudo eu vi: a porta de todo conhecimento, feita de um mármore branco, reluzente e robusto, iluminado como nenhuma luz que já houvera posto meus olhos.

Eu vi o presente, compreendi o futuro e aprendi com o passado, eu dancei com anãs brancas e comi com buracos negros.

Eu aprendi todas as línguas e vivi mil vidas, fui um mercenário e um hindu, fui um índio e um fui um descobridor, fui jesuíta e franciscano, fui nazista, socialista, batista e capitalista…

Um sino tocou alto e cheio de santidade, um arauto eloquente. Sinalizava o fim de tudo.

Dai, as cores foram tomando um tom carmesim, um filtro de sangue me encheu as vistas,..

Maldito poço de água limpa e espelhada.

sexta-feira, 27 de novembro de 2009

O MONSTRO GRANDE

 

Foi em 1933, eu estava sentado tomando um café e comendo umas torradas. Ao longe  o vento soprava calmo, e um mato verde soltava no ar um cheiro refrescante.

O sol não estava no céu, tudo estava coberto de densas nuvens, algumas com tom de cinza, outras com formas de animais.

Meu cachorro perseguia algumas penas, que levadas pelo vento, causavam-lhe tremenda hostilidade. Caça.

Tudo colaborava para o sono,…

Foi aí que me irrompeu aos ouvidos, um som que nunca ouvira, muito vagabundamete poderia compará-lo com o som do vento urrando contra as rochas. Evidentemente, que o som do vento nas pedras causa uma paz profunda, diferentemente do que eu ora escutava. Som de tormento.

Ao ouvir tal som, iniciou-se dentro de mim um debate interminável, minha razão medrosa, brigava contra minha emoção descuidada, e, a minha experiência, que nada mais é do que o nome que eu resolvi dar aos meu erros, dizia-me para fingir me de morto.

Derramei o café no chão, e joguei-me sobre ele, de olhos fechados e respirando muito vagarosamente. Sempre tive um talento nato para ser defunto.

O som se aproximou, chegou perto de casa, bateu na minha porta, mas aparentemente não me viu,  de modo que ali permaneci, horas, talvez dias,..

Não sei dizer bem, só não me lembro de ter tanta barba no meu rosto, e no final, acho , melhor, tenho por certo que dormi profundamente.

Muitos anos mais tarde, lendo um livro de biologia, no capítulo de animais exóticos, acebei descobrindo que ser me visitara naquele dia.

Era um monstro muito grande, raro e extremamente procurado por ser muito , muito valioso,.

Se tratava da besta chamada felicidade.

Passei a vida sem ser visitado por ela, quando finalmente fui contemplado, minha covardia cobrou-me a chance.

Até hoje fico tomando café, e tentando recriar o cenário daquele dia, na busca de poder fazer-me isca para a felicidade.

Quisera eu ter a honra de por ela ser devorado.

sexta-feira, 6 de novembro de 2009

O CERRADO BRANCO

cerrado

No canto esquerdo da serra nenê vivia Adeijoydilson, Adei por parte de mãe,(Adeivana) e Joydilson por parte de parte de pai.

Adeijoydilson era casado com Madeinusa, filha de Jovanildes e Kellysuelly.

Tinham um filho ainda bebê, Madeindilson.

A vida era feita de paus retorcidos e a comida era mandioca, vez por vez  tinha um lobó de mistura.

A casa era de madeiras nada nobres, tudo muito pobre mesmo, confeccionado com o suor de um e os desesperos do outro.

Madeinusa se casou para não apanhar mais do pai alcoólatra, só isso, sem amor, sem sonhos, sem promessas, sem cerimônia e sem salgadinhos no final.

Na parede, a foto de um candidato a vereador, que eles nunca conheceram, e que prometera uma botina a Adeijoydilson, se ele votasse no tal candidato.

Analfabeto não vota, candidato burro !

Gente que come mandioca o ano todo, não vota candidato burro !

O cerrado não conhece o Senado, o agricultor não sabe onde fica a câmara de vereador.

É gente de outra gente,…

Foi que um dia bateu um vento frio, um guará ganiu alto e um homem de olhos claros disparou.

O disparo insistiu,…

O homem insistiu,…

Naquele dia o cerrado viu acabar as crônicas de Adeijoydilson.

O sangue dele era branco,…

Comia muita mandioca.

quinta-feira, 29 de outubro de 2009

NO MORRO DA JAQUEIRA




Era fim de dia no morro da jaqueira.Os moleques corriam pela feira, os feirantes vendiam os seus produtos.
Não havia um sequer que estivesse bem vestido, não havia um sequer cuja vida fizesse sentido.
Todo mundo vivia a suar, o troco de hoje a vida não podia pagar.
É assim no morro da jaqueira.
E aqui vive gente encrenqueira, um povo que não trabalha e vive de atrapalhar a comunidade inteira, tem um tal de Zé Caveirão que rouba que mata e pra quem ninguém diz não.
Mas é morro da jaqueira, de uma vida pederneira.
Quem reza, reza pouco, pede no sufoco pra sair do morro da jaqueira.
O governo já disse que o morro é problema social, que o povo da jaqueira coloca o Brasil mal, que agente só serve pra descer o nível social.
Eu nasci foi na jaqueira.
Essa fruta espinhosa por fora, gordurosa e melosa por dentro, mas que a fome de uma família inteira.
Ai se eu tivesse nascido em terra estrangeira, tivesse estudo e trabalho e não vivesse de descer a ladeira, mas a vida ainda é verdadeira e amanhã é dia feira.

quinta-feira, 22 de outubro de 2009

PROFECIAS DO POÇO

Certa vez, em um país distante e muito quente, havia um casal de jovens.

A moça era toda comedida e cheia de talentos, apesar de seu gênio forte e suas opiniões intransmutáveis, carregava uma aura de bondade, era muito bela e tinha o dom de fazer rir a toda gente.

O moço era mais desinibido, cheio de gostos só dele e esquisitices únicas,  era de um traço genioso um tanto rígido, conquanto sua personalidade fosse exótica, era simples e a com todos convivia bem.

Seus nomes eram Naile e Édigo.

O casal de nossa estória num certo dia de chuva e cheiro de terra molhada, colhia espigas de milho. No meio da colheita, Naile deu um grito e cortou o seu pé esquerdo.

O grito chamou a atenção de Édigo que de pronto foi em direção ao som que ouvira.

Naile havia cortado seu pé em uma pedra afiada, e o moço inconformado logo começou a vasculhar o local e verificar, qual o motivo daquela pedra estar ali.

Enquanto limpava e cavava em volta da pedra, encontrou uma pesada rocha em forma de moeda, essa moeda de pedra tampava a boca de um buraco.

Retiraram a tampa e viram um poço, fundo e frio.

Naile disse que seria bom ela lavar o machucado, Édigo providenciou uma corda e um balde e de imediato já havia água disponível.

Naile sentiu um calafrio ao lavar seu pé com aquela água geladíssima.

Os dois olharam pra dentro do poço e viram imagens estranhas e sons que não compreenderam; imagens de Édigo deixando Naile e de desgraças,…

Choros de crianças e gritos de crianças.

Saíram logo dali, voltaram as suas casas e pouco meses depois casaram-se.

Viveram felizes e prósperos por longos anos.

O que eles não sabiam, é que na parte debaixo da tampa de pedra do poço, havia uma mensagem que assim dizia:

“Poço das profecias, se mesmo por que por uma gota oferecer-nos sangria, o poço lhe mostra todas as gritarias, escândalos e agonias que a vida lhe reserva.”

Ainda bem que eles não leram a pedra, e não viveram sobre o império do medo das profecias.

Tudo que o poço profetizou aconteceu, mas muito mais do que o poço não profetizou veio a acontecer.

Tudo leva a crer que o casal acreditou mais em suas próprias profecias.