sexta-feira, 27 de novembro de 2009

O MONSTRO GRANDE

 

Foi em 1933, eu estava sentado tomando um café e comendo umas torradas. Ao longe  o vento soprava calmo, e um mato verde soltava no ar um cheiro refrescante.

O sol não estava no céu, tudo estava coberto de densas nuvens, algumas com tom de cinza, outras com formas de animais.

Meu cachorro perseguia algumas penas, que levadas pelo vento, causavam-lhe tremenda hostilidade. Caça.

Tudo colaborava para o sono,…

Foi aí que me irrompeu aos ouvidos, um som que nunca ouvira, muito vagabundamete poderia compará-lo com o som do vento urrando contra as rochas. Evidentemente, que o som do vento nas pedras causa uma paz profunda, diferentemente do que eu ora escutava. Som de tormento.

Ao ouvir tal som, iniciou-se dentro de mim um debate interminável, minha razão medrosa, brigava contra minha emoção descuidada, e, a minha experiência, que nada mais é do que o nome que eu resolvi dar aos meu erros, dizia-me para fingir me de morto.

Derramei o café no chão, e joguei-me sobre ele, de olhos fechados e respirando muito vagarosamente. Sempre tive um talento nato para ser defunto.

O som se aproximou, chegou perto de casa, bateu na minha porta, mas aparentemente não me viu,  de modo que ali permaneci, horas, talvez dias,..

Não sei dizer bem, só não me lembro de ter tanta barba no meu rosto, e no final, acho , melhor, tenho por certo que dormi profundamente.

Muitos anos mais tarde, lendo um livro de biologia, no capítulo de animais exóticos, acebei descobrindo que ser me visitara naquele dia.

Era um monstro muito grande, raro e extremamente procurado por ser muito , muito valioso,.

Se tratava da besta chamada felicidade.

Passei a vida sem ser visitado por ela, quando finalmente fui contemplado, minha covardia cobrou-me a chance.

Até hoje fico tomando café, e tentando recriar o cenário daquele dia, na busca de poder fazer-me isca para a felicidade.

Quisera eu ter a honra de por ela ser devorado.

sexta-feira, 6 de novembro de 2009

O CERRADO BRANCO

cerrado

No canto esquerdo da serra nenê vivia Adeijoydilson, Adei por parte de mãe,(Adeivana) e Joydilson por parte de parte de pai.

Adeijoydilson era casado com Madeinusa, filha de Jovanildes e Kellysuelly.

Tinham um filho ainda bebê, Madeindilson.

A vida era feita de paus retorcidos e a comida era mandioca, vez por vez  tinha um lobó de mistura.

A casa era de madeiras nada nobres, tudo muito pobre mesmo, confeccionado com o suor de um e os desesperos do outro.

Madeinusa se casou para não apanhar mais do pai alcoólatra, só isso, sem amor, sem sonhos, sem promessas, sem cerimônia e sem salgadinhos no final.

Na parede, a foto de um candidato a vereador, que eles nunca conheceram, e que prometera uma botina a Adeijoydilson, se ele votasse no tal candidato.

Analfabeto não vota, candidato burro !

Gente que come mandioca o ano todo, não vota candidato burro !

O cerrado não conhece o Senado, o agricultor não sabe onde fica a câmara de vereador.

É gente de outra gente,…

Foi que um dia bateu um vento frio, um guará ganiu alto e um homem de olhos claros disparou.

O disparo insistiu,…

O homem insistiu,…

Naquele dia o cerrado viu acabar as crônicas de Adeijoydilson.

O sangue dele era branco,…

Comia muita mandioca.

quinta-feira, 29 de outubro de 2009

NO MORRO DA JAQUEIRA




Era fim de dia no morro da jaqueira.Os moleques corriam pela feira, os feirantes vendiam os seus produtos.
Não havia um sequer que estivesse bem vestido, não havia um sequer cuja vida fizesse sentido.
Todo mundo vivia a suar, o troco de hoje a vida não podia pagar.
É assim no morro da jaqueira.
E aqui vive gente encrenqueira, um povo que não trabalha e vive de atrapalhar a comunidade inteira, tem um tal de Zé Caveirão que rouba que mata e pra quem ninguém diz não.
Mas é morro da jaqueira, de uma vida pederneira.
Quem reza, reza pouco, pede no sufoco pra sair do morro da jaqueira.
O governo já disse que o morro é problema social, que o povo da jaqueira coloca o Brasil mal, que agente só serve pra descer o nível social.
Eu nasci foi na jaqueira.
Essa fruta espinhosa por fora, gordurosa e melosa por dentro, mas que a fome de uma família inteira.
Ai se eu tivesse nascido em terra estrangeira, tivesse estudo e trabalho e não vivesse de descer a ladeira, mas a vida ainda é verdadeira e amanhã é dia feira.

quinta-feira, 22 de outubro de 2009

PROFECIAS DO POÇO

Certa vez, em um país distante e muito quente, havia um casal de jovens.

A moça era toda comedida e cheia de talentos, apesar de seu gênio forte e suas opiniões intransmutáveis, carregava uma aura de bondade, era muito bela e tinha o dom de fazer rir a toda gente.

O moço era mais desinibido, cheio de gostos só dele e esquisitices únicas,  era de um traço genioso um tanto rígido, conquanto sua personalidade fosse exótica, era simples e a com todos convivia bem.

Seus nomes eram Naile e Édigo.

O casal de nossa estória num certo dia de chuva e cheiro de terra molhada, colhia espigas de milho. No meio da colheita, Naile deu um grito e cortou o seu pé esquerdo.

O grito chamou a atenção de Édigo que de pronto foi em direção ao som que ouvira.

Naile havia cortado seu pé em uma pedra afiada, e o moço inconformado logo começou a vasculhar o local e verificar, qual o motivo daquela pedra estar ali.

Enquanto limpava e cavava em volta da pedra, encontrou uma pesada rocha em forma de moeda, essa moeda de pedra tampava a boca de um buraco.

Retiraram a tampa e viram um poço, fundo e frio.

Naile disse que seria bom ela lavar o machucado, Édigo providenciou uma corda e um balde e de imediato já havia água disponível.

Naile sentiu um calafrio ao lavar seu pé com aquela água geladíssima.

Os dois olharam pra dentro do poço e viram imagens estranhas e sons que não compreenderam; imagens de Édigo deixando Naile e de desgraças,…

Choros de crianças e gritos de crianças.

Saíram logo dali, voltaram as suas casas e pouco meses depois casaram-se.

Viveram felizes e prósperos por longos anos.

O que eles não sabiam, é que na parte debaixo da tampa de pedra do poço, havia uma mensagem que assim dizia:

“Poço das profecias, se mesmo por que por uma gota oferecer-nos sangria, o poço lhe mostra todas as gritarias, escândalos e agonias que a vida lhe reserva.”

Ainda bem que eles não leram a pedra, e não viveram sobre o império do medo das profecias.

Tudo que o poço profetizou aconteceu, mas muito mais do que o poço não profetizou veio a acontecer.

Tudo leva a crer que o casal acreditou mais em suas próprias profecias.

segunda-feira, 19 de outubro de 2009

SONHOS DE NORACILA

 

Longe, no mundo das savanas, vivia Noracila.

Era branca e rosada, tinha os cabelos dourados e a boca avermelhada; meio brava, meio menina, meio flor, meio limão, mas uma coisa Noracila não era ao meio, apaixonada, posto que disso sim era todo seu coração.

Uma noite ela encontrou um fauno de barba loira e cabelos encaracolados, um sujeito quase engraçado, quase despojado, porém, muito centrado, muito programado, muito amedrontado, mas que fez a menina doar-lhe o coração.

O nome do fauno amado era El Donaro,  um nome cheio de pompa e poder, Noracila não pode conter sua emoção, e quis com ele para sempre viver.

Chamou ao fauno de sua razão de ser, beijou-lhe com as dádivas de todo poder, perdeu-se no bicho homem, que com cara de poeta, mudou seu modo de ser e das coisas ver.

Casou-se com ele em muitos pensamentos, e a todo momento imaginava como tudo haveria de ser; pensava nas velas, e nas crias, nas noites de magia e nos móveis que queria ter.

Via vidraças com asas de traças, abajures com vagalumes, via cadeiras e perto delas esteiras, olhava para o fogo da lareira, que ainda não existia, mas que o conforto nas tardes de geleira, por certo ia trazer.

Já amava os filhos que não tinha, já vivia a vida que não vinha, já respirava o ar das manhãs futuras.

Dormia com sonhos futuros e sonhava com noites por vir.

Tudo era ela e o fauno, não havia eu ou você, tudo era nós e mesmo que fosse uma só noz, ela queria, não , teria, que  dividir.

Noracila se afastou dos amigos e mudou seus gostos, mesmo que fosse o desgosto, gostava mais do que o gosto de não agradar o objeto de adoração de todo seu ser.

A sua cor favorita mudou, seu feriado preferido alterou, seus sabores mais gostou trocou e seus pensamentos cambiou.

O Fauno não ligava, somente as vezes imaginava como as coisas poderiam ser.

Foi nessa vida desmedida e desigual, que o belo casal, a dor rotinal pôde conhecer, principiou seus precipícios, visitou alguns hospícios, e o mundo foi ficando mais real,..

O fauno já não era mais meio animal, perdeu o encanto original.

Noracila já não era tão jovial, mesmo que seu amor continuasse todo normal, o fauno, lembrou-se de ser mais homem e menos animal, começou amar menos, e não mais que logo, o fogo inaugural, logo, se fez tição e morreu a chama de inanição.

O fauno disse:

- Não te quero, isso não é normal !

Noracila, não acreditava e dizia:

- Calma, espere, eu sei que tudo vai acabar bem no final, procure um hospital.

O fauno já não queria aquilo, afinal, já era decisão terminal e Noracila já amargava sua despedida sentada no fundo do quintal.

A flor do amor secou-se.

A chama da paixão cessou-se.

A pedra da certeza trincou-se.

O sonho do futuro acordou-se.

O cristal marital despedaçou-se

tudo ou-se, tudo ia, mas agora já era!

Noracila era só agonia, só sangria, era só !

Noracila foi ficando amarela, magrela e singela,..

Deitou-se no quintal e esqueceu-se de sí mesma,..

O vento, a terra e a chuva, sentido culpa, enterraram-na.

Meses depois, floriram tristes margaridas.

Foi assim a ida.

O fauno e Noracila, uma novela sentida.

sexta-feira, 16 de outubro de 2009

Uma folha




Uma folha

Carrega a folha
No vento
Voa meu pensamento
Constante gotejar

Até que se perca
O controle
Da gota que
Se torne rio

Aguaceiro de
minha mente
afogar-se em mim

até que de rio
vire mar
até que eu possa acordar.

quinta-feira, 15 de outubro de 2009

O VIOLINA DE ALINE

Num apartamento apertado vivia Aline.

Sonhadora e leve como um suspiro, Aline vivia com os pés na terra e a mente nos céus; diziam todos que ela era burra.

Nunca soube nada e de tudo que aprendeu esqueceu mais da metade, era muito educada e possuía uma erudição única, contudo, os saberes seus de nada adiantavam, de nada lucrava e de nada construíam.

Aline era como um travesseiro meio vazio, cheiro de camomila e cores meio apagadas.

Se não tivesse nascido gente, teria sido uma brisa de primavera ou um dente-de-leão voando nos ares.

Aos 5 anos de idade Aline ouviu um som desconhecido, era um gemido agudo e longo, triste como só a vida pode ser.

Foi paixão à primeira ouvida, não dormiu  bem por muitas, desejosamente atormentada pela paixão que aquele som lhe produzia.

Deitava e sentia um comichão lhe correr a espinha, só de reproduzir mentalmente o som que tanto amava.

Num certo fim de tarde, voltando da costureira, Aline voltou a ouvir os gemidos musicais de sua paixão, contava então 12 anos, e, de pronto perseguiu o som, com a avidez que os corações apaixonados têm.

Descobriu o nome de seu eterno amor: violino !

Chorando copiosamente, pediu ao dono do instrumento que lhe permitisse abraçar o violino.

Abraçou e amou cada pedaço daquele instrumento, sentiu a textura lisa e fria da madeira, o cheiro das cordas e as cores de cada veio da madeira.

Era como se ela fosse de madeira e os seus dentes de marfim, as tripas os cordames  e tudo lhe fosse música desde o principio.

Comovido o dono do violino disse:

- tente tocar !

E ela tentou, e para surpresa de todos, menos do violino, tocou lindamente, vibrando com seu corpo a cada nota trêmula que produzia.

O dono do violino disse:

- pode ficar com ele, você é que devia ser dona dele !

Aline de sobressalto beijou o dono do violino e correndo em lágrimas de alegria, saiu contente rumo à sua morada.

Cruzou uma rua e mais 2 quadras, tudo estava mais lindo do que nunca, até os mendigos pareciam mais bonitos.

Um disparo .

Aline morreu, vítima do instrumento musical de um PM, um homem de 45 anos, frustrado com seu instrumento, o 38, irado por ser um fracasso na música.

Aline foi enterrada com seu violino.

Dizem que de noite, perto de seu túmulo, o vento sopra as melodias de Bach.

quarta-feira, 14 de outubro de 2009

Hum...






Hum...

Haverei eu de
Soprar meu sopro
De voar descalço
De beber a chuva

Haverei de haver
De ser
De sentir
Haverei de rir


Rir-me-ei de ti
Rir-te-ás de mim
Rir-se-ão de todos

E havendo
De não haver
Não haverá o riso.

A MENINA DE VENTO

 

Era uma vez uma menina chamada Zefirina,  que amava correr com os cabelos soltos, fazer bolhas de sabão e assoprar poeira pelo ar.

Cresceu sozinha, ninguém sabe de quem ou quando nasceu, de onde veio e para onde ia.

Nunca foi vista comendo nada, nem bebendo nada, vivia de vento essa menina Zefirina.

Tinha a pele bem branca, mesmo ficando o dia todo ao sol, e nos olhos um azul indescritível; um nariz muito fino e delicado e uma boca bem pequena, com os lábios roxos.

Todos gostavam muito dela e adoravam vê-la correndo pelas colinas.

Havia alegria naquele lugar só por causa dela, e, faz muito tempo que não mais sabe dela.

Ela cresceu e encontrou um rapaz. Casou !

terça-feira, 13 de outubro de 2009

OS GUERREIROS DE COBRE

 

Há mais de 500 anos havia um grupo de soldados conhecido como os soldados de cobre.

Não tinham nomes, apenas apelidos, não tinham casas, nem famílias e nem nada.

Nem mesmo armaduras alguns tinham.

Todos eram filhos de eiras e beiras, nobres anônimos; célebres crias do acaso.

Foi que um dia um rei sem braço, para não dizer sem coração, iniciou contra eles tal perseguição, tão dura quanto a religião, tão má quanto pode ser um pagão.

Eles lutaram com o nada que tinham, venceram a maioria dos inimigos, mas a maioria, infelizmente, era menor do que o todo.

Comeram o lodo, foram sepultados sem caixão, nem trombeta, nem tiro de canhão, parecia um funeral de vilão.

Dos troços encontrados nos destroços, acharam uns poucos fósforos, alguns desenhos, roupas velhas e uma placa de cobre.

Na placa podia-se ler: “- estes são os bravos guerreiros de DEUS, são altos como arbustos, fortes como grilos e bons como dias de chuva; lutam pelo bem, suas espadas são fugas, seus escudos a verdade. Não conhecem de bens a prosperidade, mas, carregam um tesouro no coração. Um alerta:  QUEM QUER QUE OS MATE, VIVERÁ COMO CÃO, DESEJARÁ SER DESPEDAÇADO POR LEÃO, MISÉRIA, TRISTEZA E MORTE, ALÉM DE ETERNA MÁ SORTE, SÃO AS PROMESSAS, PARA TODOS OS QUE NESSA MALDADE COLOCAREM O CORAÇÃO.

Dizem que o rei furou os próprios olhos e morreu 9 meses depois.

Dizem que a batalha nem foi sangrenta, que os soldados vencidos, foram na verdade convencidos a abandonar o caminho do mal.

Dizem que os guerreiros de cobre eram apenas um grupo de 23 crianças, todas órfãs e sem lembranças da terra natal.

Dizem que foram mortas a pau, pelo rei, seus mais fiéis servos e por um animal.

Eu não digo nada, mas, eu digo:

Fui um dos vencidos e hoje eu odeio o mal.

sexta-feira, 9 de outubro de 2009

O CORO DA VILA ESQUECIDA

 

Meu nome é Yohanan, sou um viajante e colecionador de artigos raros, ganho a vida com o comércio de tecidos de  rhina e com as pratarias de potosí.

Uma vez eu estava andando pelas montanhas de um país do sul, segui os caminhos de um mapa que comprei na região. Mapa muito bonito, feito com esmero, em couro de bode.

Andei por ravinas, cruzei riachos, comi frutos locais e cruzei pontes frágeis como gravetos.

Ouvi sons de pássaros, mas não os vi, senti cheiro de flores de orquídeas, mas não pude encontra-las.

Andei até meus pés decidirem seus próprios rumos, apenas me deixei levar; fui seqüestrado pelos meus músculos, minha alma ficou refém de meu corpo por 21 dias.

Foi quando acordei em uma cama que nunca estivera, nunca tive uma cama minha, o mundo sempre me foi teto, e o chão o leito meu desde o berço.

Perto da cama o som de madeira sendo queimada, um cheiro de ervas sendo cozidas e uma luz muito trêmula, que cortava a fumaça, desenhando formas que não conseguia distinguir.

Ao longe eu ouvia vozes, todas muito bem afinadas entoavam um canto: triste, belo e nostálgico.

Algo como: “ Oh quão santa, tão amiga, (…) somos os teus medos na terra(…) nossos nomes viraram cantigas, nosso sopro apagou-se com velas( …) somos teus para sempre(…) nosso sono, velado em leito de flores (…) nossos amores comeram terra,…”

Era um canto longo, parecia durar dias; algumas vezes, uma ou outra voz se destacava e cantava feitos heróicos, como também, entoava cenas miseráveis.

Durante 3 dias arregimentei forças, mas meus músculos estavam exaustos, de modo que fiquei entre o sono do corpo e a euforia da alma.

finalmente fiquei de pé !

Sai da casinha em que estive, não vi ninguém, mas vi muitas coisas,…

Depressa sai daquele lugar, fechando os olhos e correndo feito louco; machuquei os pés e recebi pancadas em todo corpo, sentindo frio intenso nas costas e um sopro quente na testa.

Desmaiei e acordei no local onde havia comprado o mapa.

Muita gente a minha volta.

Estava babando e com um cheiro horrível, barbudo feito um bode velho, com a garganta seca e o corpo doído.

Me contaram que fui achado nas montanhas, e que na minha boca havia um suco marrom e restos de cogumelo.

Disseram que eu cantei uma música que ninguém entendia, e, por pouco não fui enterrado vivo, pelo medo que o povo tinha de bruxaria.

Nunca mais voltei às terras do sul.

quinta-feira, 8 de outubro de 2009

O COLAR DE LISANDRA

Havia numa cidade muito pequena, localizada em uma ilha muito distante do continente, uma vila de pescadores.

Nesta vila viviam, Ditomasio e sua jovem e bela esposa Lisandra.

Ditomasio era apaixonado por Lisandra, amava-a mais que tudo, e, amava muito a vida, o mar, os ventos frios e as manhãs de neblina, todos muito costumeiros naquele lugar.

Lisandra apenas gostava de Ditomasio, e ainda assim, gostava do respeito e admiração que ele tinha de todo na ilha.

O povo da vila não gostava de LIsandra, achavam-na muito antipática e vazia, fosse como fosse, a tal antipatia vinha das falas de Lisandra que, sempre tinha assunto, desde que o papo fosse: jóias, roupas, riqueza e fama.

Um dia Lisandra achou um prato de bronze, enquanto caminhava na beira da praia, havia en tal prato o desenho de um tridente, cercado por flores e por caveiras.

E do lado inverso do prato havia uma prece, um pacto, que assim dizia: “ Bela para sempre, de todo adornada, desde que a vida dada, de amor seja feita, a dona do prato satisfeita, e, o colar lhe ornando o corpo, Poseidn jura que o desgosto, não terá tamanho e nem fim”

Lisandra leu e não entendeu.

Levou o prato a Sarxis, uma velha agoureira, e a anciã lhe explicou: – O prato só aparece aos de coração vazio ! E se o prato receber o sacrifício de um coração cheio de amor, dá ao seu senhor, tudo quanto quiser, desde que o senhor do prato use o colar que sela o pacto.”

Lisandra não pensou mais; chamou Ditomasio para um passeio em seu barco à vela, pediu que levasse frutas e vinho, pão e velas.

Foram os dois em meio ao mar tranquilo da ilha. o vento soprava gostoso, com cheiro de colméia.

Os dois comeram, beberam e fizeram amor intensamente à luz das velas, estrelas e lua.

Ditomaso dormiu; acordou todo amarrado,  com a âncora do barco no peito, foi empurrado por sua amada, recolhido ao leito de morte oceânico.

Lisandra regressou sozinha, chegou na praia e viu uma linha dourada, andou recolhendo-a, achou um colar lindo, cheio de jóias, e, o fio era de ouro.

Vendeu o ouro e ficou rica, colocou o colar e ficou famosa.

Vivei mais 35 anos, sempre jovem, sempre bela, sempre rica,…

Morreu afogada com um copo de água, sozinha, feia como a desgraça, velha como o tempo e fedia mais que qualquer carcaça, enterraram-a fundo, e com um âncora no peito.

Usaram seu túmulo como recipiente, para toda matéria indigente, fezes, urina e qualquer imundície.

Lisandra chegou no mundo dos mortos, sem olhos, sem língua e sem coração

quarta-feira, 7 de outubro de 2009

O PARDAL


HAVIA NUMA VILA DE PLANTADORES DE CENOURA UM MENINO DE UM OLHO SÓ. SEU NOME ERA SORANO E ELE VIVIA A OLHAR OS CÉUS. NASCEU NORMAL, PERFEITO, CONTUDO, AOS 5 ANOS SAIU PASSEANDO SOZINHO PELA VILA; GRITOU, ACORDOU NUMA CAMA, AOS CUIDADOS DE UMA VELHA DESCONHECIDA. TODAS AS MANHÃS ACORDAVA CONTADO SONHOS. SONHOS COM NUVENS, SONHOS COM MATAS, SONHOS COM VILAS AOS QUAIS ELE NUNCA FORA, SONHOS COM PESSOAS AS QUAIS NUNCA CONHECERA. SORANO TINHA UM MEDO ENORME DE GATOS, COBRAS, AVES DE RAPINA E PREDADORES DE PEQUENOS ANIMAIS. CERTA MANHÃ SORANO ACORDOU CHORANDO, LÁGRIMAS DE UM OLHO SÓ. SONHOU COM UMA CAMPINA, CHEIA DE HORTALIÇAS E EM ESPECIAL UM CAMPO DE CENOURAS, NADA DE NOVO, EXCETO PELO SOM DE UM TROVÃO E UM CUSPE COMO DE FOGO. DESDE ENTÃO, SORANO, SÓ SONHA COM COISAS DA TERRA. ELE NÃO SE LEMBRA, MAS, EU ESTAVA LÁ. VÍ QUANDO ELE CAIU EM CIMA DE UMA ARAPUCA, FUROU UM OLHO; O ACIDENTE LIBERTOU UMA AVE, UM PARDAL, QUE FUGIU VOANDO. O OLHO QUE SORANO PERDEU, LIBERTOU O PARDAL, QUE SE SENTIU GRATO.
O PAI DE SORANO, ODIAVA OS PARDAIS, QUE ARRUINAVAM OS QUINTAIS E METIAM O BICO EM TUDO QUANTO FOSSE HORTA.
MATOU O PARDAL, QUE LHE DEVORAVA AS CENOURAS RECÉM COLHIDAS, CEGOU SORANO DO OLHO CELESTIAL.
SORANO ATÉ HOJE OLHA PARA OS CÉUS, COMO QUEM SENTE SAUDADE DE CASA.

terça-feira, 6 de outubro de 2009

ARCO-ÍRIS LUNAR



OS ENCANTOS DAS CORES ESCURAS

Quando chove, em noites de lua cheia, a luz do sol refletida na lua cria um efeito todo especial: o arco íris lunar.

O espectro criado por esse fenômeno é invisível aos olhos humanos, porém, os animais com a capacidade de visão diferente da nossa, conseguem ver o arco íris lunar.

Algo como um círculo branco se posiciona em volta da lua, formando uma espécie de olho de DEUS, com a lua como a íris desse globo ocular. E a beleza das trevas se comprova de maneira ainda mais evidente, um espetáculo da noite, uma primavera invisível e silenciosa, contudo, deveras linda de ver.

Um arco íris maravilhoso, cheio de cores que não posso descrever, cheio de flores que não posso ver, cheio de vida que não posso matar. Um elo perdido.

As trevas deixam a habitual maldade e se entregam ao canto inaudível da serenata cósmica, sob o belo arco íris negro, branco , cinza e cor de cegueira.

Uma festa de morcegos e insetos, um feriado santo para os bichos das cavernas.

Quando surge o dia, como um moleque atrevido, futricando com luz tudo quanto toca, como que espiando pela fechadura do universo e enchendo de luz toda a formosura linear do horizonte; os adeptos do culto oculto, os sacerdotes do invisível, conjuntamente com os cardeais da cegueira, olham para a matinal estrela, e, com desprezo, dizem:

Vamos ! Que a luz já contamina e amanhã é segunda-feira.